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19 de abril de 2012

Segue uma reflexão minha sobre a greve de professores da rede estadual de ensino do estado da Bahia deflagrada na ultima quarta-feira (11/04/2012).

Ela me foi provocada por uma colega que solicitou uma reunião para que retornássemos ao trabalho. Sempre fui a favor do livre direito de expressão e da exposição de idéias conflitantes, por isso exponho aqui a minha.
Se após lê-la acharem por bem socializá-la, sintam-se a vontade.



Elisângela Sales Encarnação - Professora da educação básica da rede estadual de ensino publico do estado da Bahia. Graduada, especialista e mestre em História.
Entra ano e sai ano e nós, profissionais da educação, repetimos nas escolas, nas salas de aula, na sala dos professores, em casa, em conversa com amigos, na mídia.... o quanto nossos salários são baixos, o quanto a nossa profissão é desvalorizada, o descaso dos governantes a respeito da educação, que os pais não dão valor a educação dos filhos, e até que nossos alunos são desinteressados e não sabem da importância que a educação tem na vida deles. Exigimos o respeito que a nossa profissão, que a nossa função social, que os anos de estudos, que o árduo trabalho diário de lidar com centenas de crianças e/ou adolescentes merece. Mas, quando chega um momento crucial como esse, em que uma greve de professores é deflagrada porque um governante se recusa a cumprir o acordo por ele assumido, que tentou por meio de diferentes manobras fazer com o que reajuste dos professores de todo o Estado brasileiro fosse inferior ao que a presidenta determinou, em cumprimento da lei (ratificada pelo supremo Tribunal de Justiça), é que percebemos queRESPEITO É PRA QUEM SE RESPEITA.
É muito triste que num momento crucial como esse, onde a nossa categoria de professores deveria estar unida para que enfrentássemos os muitos percalços que a decisão tomada na ultima quarta-feira vai nos gerar na mídia, nas declarações do governador (se ele se der ao trabalho), do secretário de educação, de alunos, dos pais de alunos, tenhamos muitas vezes que lutar para convencer nossos próprios colegas a aderir ao movimento que luta para o bem e pelos direitos de todos os professores. Alguns munidos de argumentos como: “a greve não vai dar em nada”; “vai prejudicar apenas a nós professores, e aos alunos, pois o governo não nem aí”; “vai sacrificar nossos sábados e merecidas férias do final do ano”, ou até, “eu já ganho acima do piso”, então, para que lutar?
O clima de derrotismo tomou conta dos professores baianos em decorrência do constante desrespeito do atual governo com a educação, desde seu primeiro mandato, quando ele foi o primeiro governador a zerar os contracheques dos professores porque estes estavam em greve ou a ser irredutível na perspectiva de que só negociaria se voltássemos a trabalhar (a nós tratar como cachorros que colocam o rabo entre as pernas quando o dono bate o pé). Mas, não somos os únicos a nos sentir assim derrotados, humilhados, com medo. Basta lembrar o tratamento autoritário e desrespeitoso dado aos policiais em greve recente (não quero, com isso, abonar as falhas de alguns policiais). É o funcionalismo público baiano que se sente assim, diante de postura tão agressivamente autoritária do atual governador, que nos faz questionar: cadê a sensibilidade do sindicalista de outrora?
Para esses colegas, só gostaria de lembrar que, na história, nenhum ganho social veio sem luta. Luta que custou, muitas vezes, a vida e a liberdade de muitas pessoas. Todos os direitos alcançados, o foram com sangue , suor e lágrimas. E agora vamos desistir porque precisaremos trabalhar nos sábados e sacrificar as férias? E os muitos mortos, presos e torturados para que pudéssemos ter direitos iguais, direito ao voto e à participação política? Direito à vida e à liberdade, direito de ir e vir, de expressar nossas opiniões, os direitos trabalhistas: jornada de trabalho, férias, salário mínimo, seguro desemprego, licença maternidade, e tantos outros mais? Estamos, quando evocamos essas perdas mínimas que teremos, desrespeitando a luta e a vida dessas pessoas. E, quando dizemos que não vamos ganhar nada agora, esquecemos que muitos morreram sem ver os frutos de sua luta, mas nem por isso eles deixaram de vir. Muitas vezes não lutamos para ganhar, e sim, para não nos deixarmos vencer pelo autoritarismo, pela tirania, pela intolerância.
No Brasil, hoje, virou moda declarar as greves ilegais e punir os sindicatos e trabalhadores com multas absurdas. Há, em curso, um processo de criminalização das greves. Esse direito histórico, que nos rendeu muitas vitórias sociais importantes, que corrigiu situações criminosas e até de atentados á vida (dado as condições desumanas, insalubres, extenuantes de trabalho de algumas categorias), passou a ser cerceado pela justiça que com isso vem paralisando os trabalhadores que dispõem de poucos meios para fazer valerem seus direitos. No entanto, essa mesma justiça não tem a mesma celeridade para corrigir os abusos trabalhistas, fazer valerem acordos firmados entre empregados e empregadores, não se apresenta como caminho possível, para o qual podemos apelar, quando nos sentimos lesados, desrespeitados em nossos direitos de trabalhador.
No caso dos trabalhadores da educação, uma questão me inquieta, e creio que seja importante nos perguntarmos: por que, das profissões de maior prestígio no nosso país em séculos passados, só o magistério perdeu seu brilho? Isso não ocorreu com médicos, advogados, engenheiros, que continuam sendo respeitados pela sociedade e bem melhor remunerados do que os professores.
O atual descaso com a educação brasileira não é algo recente. Alguns estudiosos o localizam no processo de ampliação do ensino público, especialmente quando este passou a abarcar os pobres, na década de 1930. Outros discutem os vários mecanismos utilizados durante a Ditadura Militar brasileira (1964-1985), que acabaram por desestruturar a educação: diminuir sucessivamente suas verbas (em contraposição à ampliação de sua oferta); a perseguição de professores, a vigilância das escolas e de seus profissionais, a perseguição e desintegração de entidades de classe ( estudantis e dos profissionais da educação); a mudança curricular (imposição de EMC, OSPB e Estudos Sociais no lugar de História, Geografia, Filosofia e Sociologia); o rebaixamento salarial do professorado; os cursos de licenciatura de curta duração, etc.
No processo de redemocratização política, a partir de 1985, apesar da educação servir de bandeira para todo e qualquer político que subisse num palanque desde então, seja qual for sua cor política, nenhum deles cumpriu suas promessas eleitorais de fazer da educação um dos pilares da governança brasileira.
Não é por acaso que a nossa profissão caiu no descrédito, e que somos desrespeitados todos os dias por governantes, mídias, sociedade, alunos e pais de alunos. Que somos agredidos psicologicamente, moralmente, profissionalmente e até fisicamente por aqueles que deveriam ser nossos parceiros na difícil tarefa de educar as novas gerações. É isso o que acontece cotidianamente, e em momentos como esses, em que os professores chegam ao seu limite e decidem pela greve, vemos estes agentes, muitas vezes, vir á público para culpar, detratar e até execrar publicamente a postura dos professores. Isso porque, segundo eles, no final, os alunos são os únicos prejudicados. Onde estavam esses profundos, atuantes e vorazes defensores da educação quando: os alunos não têm aulas, porque não há professores (por insuficiência no número de professores nas redes estadual e municipal, por falta de professores concursados em determinadas áreas ou localidades, por licença médicas, e tantas outras situações? E QUE FIQUE BEM CLARO: NESSES CASOS, AS AULAS NÃO SÃO REPOSTAS!). E o governo, na sua morosidade, leva meses para sanar esse problema! Quando escolas, até a presente data, ainda não começaram as aulas devido à não realização de reformas indispensáveis a seu início(reformas essas que deveriam ter sido feitas durante o recesso letivo); ou quando os governantes não repassam as verbas para as escolas, por conta, segundo eles, da burocracia, e elas precisam fazer milagres para manterem-se abertas e funcionando (ESSE É O CASO DA BAHIA NO MOMENTO); ou quando falta a merenda; ou quando professores e alunos precisam trabalhar e estudar, respectivamente, em salas mal iluminadas, sem ventilação, extremamente quentes (no calor nordestino, baiano que conhecemos), e, no período das chuvas, goteiras por todos os lados...Essa lista poderia se estender de forma quase que interminável, mas, nada disso prejudica o aluno! O governo, com seu descaso; a mídia, com seus produtos “de alta qualidade”; a sociedade, com seu consumismo; alguns pais, com sua falta de tempo; NADA DISSO PRENJUDICA O ALUNO! A ÚNICA COISA QUE O FAZ, É GREVE DE PROFESSOR.
Reconquistar nossa auto-estima, auto-respeito, amor-próprio: é o que o professor precisa de forma urgente! Só nós podemos fazer isso por nós mesmos. PRECISAMOS NOS SENTIR, ANTES DE TUDO, DIGNOS DE RESPEITO, PARA SERMOS RESPEITADOS. Precisamos assumir nossas extensas responsabilidades e exigirmos, de igual forma, nossos direitos (até mesmo para termos condições de falar de cidadania para nossos alunos).
Esse texto é, acima de tudo, um convite ao professor para essa reconquista.
Só quando andarmos nas ruas de novo, orgulhosos de nossa profissão, de cabeça erguida, como fazem os médicos, advogados, engenheiros, dentistas... Não teremos mais vergonha, nem medo de fazer greve, de lutar por nossos direitos. E, pela dignidade e auto-respeito que exalaremos NÃO, HAVERÁ NINGUÉM (MÍDIA OU GOVERNANTES) QUE TENHA CORAGEM DE NOS DETRATAR PUBLICAMENTE E DE SENTIREM QUE FAZEM MAIS PELA EDUCAÇÃO DESSE PAÍS DO QUE NÓS, QUE ESTAMOS NAS SALAS DE AULAS DURANTE 200 DIAS, TODOS OS ANOS.

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